11/07/2008

Tartaglia e Cardano

Vou contar-vos uma história...
Os dois protagonistas desta história viveram no séc. XVI, e passo a apresentar: à esquerda está Tartaglia, matemático italiano, e à direita temos Cardano, médico e matemático italiano.
















Soube-se uma vez que Tartaglia tinha encontrado uma formula para resolver equações cúbicas (3º grau) e Cardano seu colega, com a melhor das intenções, resolveu convidar Tartaglia para um agradável jantar. Durante o jantar o anfitrião foi servindo vinho e a certa altura conseguiu que o colega lhe dissesse a formula, mas Cardano teve de jurar que só a publicaria depois do seu autor.
Algum tempo depois, antes de Tartaglia ter publicado a sua descoberta, foi confrontado com a publicação da sua formula, mas quem a teria publicado...? Cardano, claro!
Tartaglia deve ter ficado furioso! Ele tinha confiado no colega e este quebrou o juramento que lhe havia feito, publicando a formula antes do verdadeiro autor.
Não sei se Tartaglia não lhe deu uma boa sova, mas de certeza que vontade não lhe faltou =P
A atitude do colega foi vergonhosa e esta situação, na altura, fez com que se debatesse sobre a importância da ética na ciência e em relação aos segredos científicos.
De qualquer maneira, a descoberta foi atribuída a Tartaglia, como era de se esperar.

12 comentários:

antonio ganhão disse...

Gostei da história, mas parece-me existir um fundo moral que questiono.
Cardano teve o seu momento de glória, tão efémero, como qualquer momento de glória e ficou na história ao lado de Tartaglia.
Vi o Mozart na Broadway, nesta peça (ao contrário do filme), a estratégia de Salieri era a de fazer crer que havia morto Mozart e assim ganhar a imortalidade! Mas não teve sorte e foi internado como um louco e atirado para o esquecimento.
Cardano foi bem sucedido e aqui estamos a falar dele... proficiência minha querida, eis a moral que levamos para o século XXI.

Somos os descendentes de Cardano.

Metódica disse...

António, não seja pessimista...
As pessoas não são todas iguais, por isso não creio que sejamos descendestes de Cardano, embora haja quem o seja, é um facto!

A ideia com que eu fico de Cardano é que era uma pessoa falsa, sinica e com mau caracter.
Cardano tem o seu nome na história da matemática e na da medicina por bons motivos: contributos que tinha dado, por exemplo, em medicina ele foi o primeiro a descrever clinicamente a febre tifoide.
Mas esta situação mostra que não tinha o melhor caracter.

A moral que eu tinha tirado é a de que não devemos aceitar alcool num jantar com matemáticos depois de termos feito uma qualquer decoberta =P

antonio ganhão disse...

Com certas pessoas nem o jantar podemos aceitar... mas olha que apoias a minha teoria: Cardano ficou mais conhecido e mais interessante de aparecer numa narrativa, por ter feito uma má acção do que por ter descoberto a febre tifóide... ;)

alf disse...

interessante história.

Mas nota uma coisa - nem sempre o verdadeiro autor é reconhecido - só que esses casos, exactamente porque o verdadeiro autor não foi capaz de se fazer ouvir, não são conhecidos.

Depois, estas histórias são frequentemente mais complicadas do que a versão que fica para a posteridade. Provavelmente, andaram os dois à procura da fórmula; provavelmente discutiram o assunto entre eles; provavelmente, o Cardano até pode ter pensado que tinha dado uma contribuição mais relevante para a fórmula, nas discussões entre ambos, do que o outro.

Uma coisa que acontece muito, que está farta de acontecer comigo, é o seguinte: uma pessoa anda à procura de uma solução para um problema; desabafa com um amigo; este faz-lhe uma sugestão que é boa mas ele não percebe; no dia seguinte, ou uns dias depois, surge uma ideia genial na cabeça dessa pessoa que lhe permite resolver o problema.

O que a pessoa já não se lembra é que esssa ideia genial foi a sugestão do amigo; este pode pensar que o outro está a ser desonesto, a dizer que é dele a ideia que lhe deu; mas eu já assisti a isto e sei que a pessoa não está a ser conscientemente desonesta - é o maroto do nosso cérebro que esconde a autoria da ideia!

O nosso cérebro é um «outro eu» muito maroto e cheio de truques, que faz de nós «gato sapato» ...

Mas, é claro, há aí muita gente sequiosa de protagonismo à caça de boas ideias que não hesita um instante em apropriar-se das ideias de outro se sentir que pode escapar ilesa.

Escreves de forma muito agradável, tens talento para isto.

Metódica disse...

António

Sim, tenho que admitir que é verdade...
Se ele não tivesse feito amáacção eu não teria história para contar =P

Metódica disse...

Alf

Obrigada, amabilidade sua :)

Sim, isso também pode ter acontecido, quem conta um conto acrescenta um ponto e não estvamos lá para poder confirmar...

Mas o nosso cerebro não se pode lembrar que algum tempo atras um colega tinha dado essa ideia genial?

alf disse...

por isso é que eu digo que o nosso cérebro é muito maroto. Ele é parcialmente autónomo da nossa vontade, ele é que decide de que coisas nos dá conhecimento. Ele age para satisfação do que considera ser a nossa conveniência. Por isso a pessoa «lembra-se» da ideia que o cérebro entretanto verificou ser genial mas «esquece-se» de quem foi o autor. E o consciente não tem hipóteses, só se começar a desconfiar: será que fui mesmo eu quem teve esta ideia? isto não parece muito meu...

O processo da «crença» também é um processo dominado pelos interesses do inconsciente. As pessoas acreditam numa religião porque ela lhes satisfaz vários interesses, a começar pela sua necessidade de imortalidade. Se não há «deuses» não faz sentido pensar que possamos ser imortais, não é? Por isso é que é tão forte a crença numa religião. E por outras necessidades que a religião satisfaz.

Mas isto não acontece só com religião, acontece com tudo. As pessoas acreditam em tudo que de alguma forma corresponda às suas necessidades e duvidam do que não serve os seus interesses. Acreditam no aquecimento global, que marte vai surgir do tamanho da Lua no dia não sei quantos de agosto, que existem neutrinos, etc, etc.

A razão mais forte para acreditarmos numa coisa não é a autoridade de quem a afirma, é a nossa conveniencia em que isso seja verdade. Mas isso não é um processo desonesto porque não é consciente, é o malandro do inconsciente o responsável.

É também por isso que as novas teorias são perseguidas - são contrárias aos interesses dos cientistas actuais, estabelecidos sobre a anterior teoria. E não é por serem «más pessoas», o inconsciente deles não lhes dá alternativa.

Para mudar isto é preciso treinar de pequeno a ver pontos de vista diferentes, aprender a duvidar de si próprio. Os americanos já têm isto nos seus curriculos escolares.

(desculpa lá o «tratado»... o meu inconsciente anda a pensar nestas coisas e resolveu aproveitar a ocasião... eu não tenho culpa, foi ele...)

Metódica disse...

Ah!
Isso explica uma dúvida que eu tive à algum tempo!

À algum tempo estava a estudar e perguntei-me porque é que quando ouvia algum nome ou informação relacionado com algum lugar ou alguma coisa decorava logo, mas que quando precisava de decorar um nome/informação relacionada com biologia, por ex. era uma carga de trabalhos. O seu comentário responde à minha pergunta.
Portanto eu não capto a informação à primeira porque como não é uma coisa que o meu cérebro (a parte inconsciente) ache relevante ou do seu/meu agrado tem uma certa inercia em fixar a informação.

Como vê o seu tratado foi bastante útil, obrigada ;)

Fá menor disse...

Se calhar somos todos uns aproveitadores uns dos outros...

Metódica disse...

Eu ainda acredito que hajam boas pessoas :)

antonio ganhão disse...

Convido-te à implumiscência visual:

http://sem-photos.blogspot.com/

Metódica disse...

Obrigada pelo comvite António.

Já lá fui, gostei! =)